sexta-feira, outubro 20

Silêncio Sobre a SIDA Num Casal

«Queridos, infelizmente o mundo está perdido... As próprias pessoas que convivem ao nosso lado anos e anos, são as que mais nos decepcionam!

Silêncio sobre a Sida num casal
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O meu marido sabia que era seropositivo e não me disse nada...
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Caiu-me o céu quando a médica disse-me: "Céu, o teu teste é positivo!!!".
Era Dezembro do ano passado. Dois meses de broncopneumonia deixaram-me pesando 27 quilos e pedi no centro médico da Rádio Nacional de Angola, onde trabalho como jornalista, para fazer o teste de HIV.

O pior estava a vir. Levei as minhas quatro filhas a fazer o teste. A caçula (mais nova), de nove anos, também é seropositiva.

Chamei o seu pai, do qual estou separada há vários anos, e que trabalha noutra província. As minhas outras filhas são de outro relacionamento. Demorou a chegar, mas apareceu. Conversamos. Convidei-lhe a fazer o teste. Ele apenas respondeu: "Agora que você sabe, é só fazer o tratamento". Contou que já faz tratamento, há alguns anos, na África do Sul. E nunca me disse nada.

A nossa relação durou onze anos. Separamo-nos sem problema algum e só hoje entendo o porque. Tivemos outro filho, que morreu com um diagnóstico indeterminado. Seria Sida?

Acho que o meu ex-companheiro não me avisou por vergonha, egoísmo,orgulho, sei lá... Se nós partilhamos uma vida durante anos, é chocante vir a saber que o meu parceiro me escondeu a sua condição. Considero esta traição como a mais baixa. Afinal já não conhecemos ninguém. O que ele fez é condenável. A primeira mulher, que faleceu há alguns anos, só agora se sabe que morreu com Sida. Neste momento, quatro filhos dele estão infectados com o HIV. É muito triste.

Desesperada, recorri à amigos. Recebi muito apoio e coragem. Tenho gerido a situação, tenho mais cuidados comigo, mudei de turno na Rádio Nacional.Hoje, sou uma mulher lutadora. Enquanto estiver viva, quero dar o melhor aos meus filhos, mas sempre de cabeça erguida.
Vivo com as minhas quatro filhas e dois órfãos de guerra que adoptei.

A minha mãe já é uma pessoa de idade avançada, é comigo que ela tem contado quer na alimentação, como na saúde. É um triplo drama que carrego neste calvário.

O mais doloroso para uma mãe é saber que tem uma filha seropositiva. Só Deus sabe o que está dentro de mim. Um sentimento de culpa por saber que foi transmitido no meu ventre, mas convicta que não foi intencional, porque não sabia da minha condição, nem a do meu companheiro.

A minha filha, para além de ser seropositiva, tem um problema de coração e tem crises constantes. Alguns exames não são feitos no país e se fazem são caríssimos. Infelizmente, até hoje ainda não pude fazer o tratamento disso por falta de dinheiro. Por isso, pode ver como me sinto. O que fazer?...

Tem sido muito difícil da minha parte, não que tenha ódio do meu ex-compaheiro... quem sou eu para o condenar, mas é uma dor muito grande que carrego sempre que imagino o quanto ele foi cruel até com a própria filha.Diga-me com sinceridade, o que merece um pai que contamina o seu filho e quase o deixa morrer? Esta pergunta tem me martelado muito a cabeça, sem contudo encontrar resposta.

O que me levou a assumir publicamente a minha condição é que, ao darmos a cara, ajudamos a todos que se encontram na nossa situação. É também uma forma de acabar com discriminação e passarem a ver-nos como cidadãos normais deste país, que coabitam com uma doença que poderia ser diabete ou cancro.

Sempre acreditei na Sida, porque é uma doença que existe. Mas, apesar da coragem que tive em fazer o teste, o impacto que tive ao receber a confirmação foi doloroso.

O mais importante para mim é poder continuar a contar com as pessoas que me estenderam a mão na primeira hora, fazer tudo que estiver ao meu alcance para que nunca faltem medicamentos e alimentação, principalmente para a minha filha seropositiva, e que Deus continue a me dar força e coragem.»

"Este triste relato, contado na primeira pessoa, apresenta a tragédia de uma mulher, mãe de família, jornalista e profissional de rádio que foi vítima de uma injustiça grotesca e atroz, foi infectada pelo vírus HIV pelo seu próprio marido.

Infelizmente, histórias como está ouvem-se um pouco por toda a parte. Sabemos muito bem que existem elementos promíscuos (Homens, Mulheres, Jovens) na nossa sociedade que sabem que são portadores do HIV e mesmo assim continuam a ter relações sexuais desprotegidas com o desígnio de infectarem o maior número de indivíduos possível. O lema é: “Se alguém me deu, eu também vou dar e não morrerei sozinho”.

Quero aqui deixar o meu mais profundo lamento e pesar. A minha angústia é grande e silenciosa. O que aconteceu com esta mãe podia ter acontecido com a minha ou com outro qualquer familiar meu. Desejo a esta família a melhor sorte do Mundo e se enquanto houver vida há esperança, acreditem sempre nela que vão conseguir ultrapassar as adversidades.

Quem vê caras não vê corações. Lembrem-se disto antes de se envolverem sexualmente com alguém. Usem o preservativo sempre e pratiquem sexo seguro. "

4 comentários:

Salucombo_Jr. disse...

no comment!

Anónimo disse...

Vou fazer o meu comentário, apesar de ter um nó na garganta. Esta situação, desta mãe de família, não é (infelizmente) única...quantas vezes o mundo tem desabado na cabeça de homens e mulheres, pelos mesmos motivos. O silêncio de quem contamina, a dor de quem é contaminado. Grande mulher e de coragem esta Sra.. Que Deus a ajude a ultrapassar todos os momentos dolorosos e cruéis que a vida lhe reserva. Um bem haja também pela coragem com que tem enfrentado tudo e pela coragem em dar a cara, faz-nos saber e sentir, que podia ser com qualquer um de nós, ou com aqueles que amamos... Força. E só desejo que possa ter mais apoios, para não se sentir tão só nesta batalha.
Um abraço imenso.
Kiara

Marcelo disse...

De fato, infelizmente, ao menos por aqui, tem crescido nos últimos anos o número de mulheres casadas infectadas pelos próprios maridos. Eles acabam desenvolvendo os sintomas, às vezes morrem, e as mulheres acabam descobrindo que são soropositivas muito tempo depois. Pode ser muito tarde... E se não se pode mais ter confiança nem na pessoa escolhida para dividir a vida, a situação torna-se bem difícil. A história contada é chocante, mas, infelizmente -- de novo --, trata-se de uma realidade que poucos têm estômago para enxergar.

Marcelo Melo - Brasil
http://marcelo74.spaces.live.com

Anónimo disse...

Olha Céu admiro muito a tua coragem em dar a cara e declarar publicamente o que tens passado nos últimos anos. Sugiro que se ainda não estudas a bilbia, começe já a estudar a biblia com uma testemunha de Jeová, O Criador do Céu, nunca abandona os que lhe buscam com o espírito e verdade. Força, força.... !!!!!