quarta-feira, janeiro 11

113

O relato seguinte aconteceu na noite de 25 de Dezembro, tal qual como a seguir descrevo:

Andava eu a passear de carro, à noite, pelas ruas de Luanda mal iluminadas e sinalizadas (mas já com muitas melhorias), quando numa qualquer rua na zona da Marginal de Luanda faço pisca à direita sem me aperceber da existência de um sinal que me proibia de efectuar tal manobra. Entro numa rua em sentido contrário e depois de andar alguns metros sem criar nenhum tipo de perigo aos utentes da via nem aos ocupantes da minha viatura, porque era uma hora morta da noite e porque era um dia calmo, apercebo-me pela orientação dos carros estacionados, que estava em sentido contrário.

De imediato inicio a manobra de inversão de marcha para poder corrigir o erro e é então que sou abordado por três agentes da Polícia Nacional, armados com armas de fogo (modelo AK 47), que me pedem os documentos da viatura e os meus. Prontamente entrego e explico que estava consciente do meu erro e que por não residir em Luanda desconhecia as ruas e a posição dos sinais. Os agentes meios embriagados apreenderam-me imediatamente os documentos todos alegando que eu tinha cometido uma infracção de trânsito, teria de pagar uma multa de 8.000.00 Kzs (100.00USD) e que a minha carta iria ficar retida.

No meu melhor, tentei com alguns argumentos dissuadir os agentes alegando que tinha eu próprio dado conta do meu erro e não era um prevaricador, conhecia o código de estrada, estava legalmente habilitado a conduzir e porque a sinalização era deficiente e porque o local onde se encontrava o dito sinal estava escuro não o tinha visto. Tentei também alegar que a função da polícia não era só punir mas também ter sensibilidade e sensatez para poder resolver conflitos quando não está perante um prevaricador. Foram infrutíferas as minhas tentativas, não consegui demover os agentes que em excesso de zelo queriam a toda força que eu fosse parar à esquadra para pagar uma multa de alegadamente 8.000.00 Kzs por ter andado 100m em sentido contrário.

Entre a intervenção dos agentes e os meus argumentos já se tinham então passados 30min. Cansado e um pouco assustado porque eram altas horas e naquela via apenas se encontravam os ocupantes da minha viatura, eu e os agentes, decido então ir até a esquadra para verificar se de facto o valor da multa era esse mesmo e na esperança que o(s) agente(s) da esquadra tivessem outro tipo de formação e fossem mais simpáticos. É nesta altura que os agentes mudam o discurso e dizem que podemos evitar a ida à esquadra, a multa e a apreensão da carta se eu lhes der “boas festas”*. Apercebi-me que toda aquela confusão não era mais do que a luta por uns Kzs, para umas Cucas** ou para um saldo. Perguntei que quantia queriam e negociei com eles, tudo ficou resolvido localmente.

Quando cheguei a casa e contei o sucedido aos kotas estes ligaram imediatamente para o número de Emergência da Policia Nacional (113) relatando todo o episódio de que tinha sido vítima. Os agentes da linha, mais bem formados e mais condescendentes, pediram a identificação dos agentes em causa, para poderem “averiguar e talvez puni-los”, mas eu não tinha a identificação deles porque não estava informado que poderia fazer queixa deles e que de facto a queixa iria ter algum seguimento.
Acho que a muitos de vós já aconteceu algo semelhante. Espero que este meu relato ajude a acabar com estas tristes e lamentáveis situações. Ficam desde já a saber que quando assim for e se sentirem extorquidos ou abusados pelo poder da farda, podem a qualquer momento (24h dia/ 365 dias ao ano) telefonar para o 113 e denunciar estes e outros casos semelhantes, desde que tenham a identificação dos agentes.

Na altura senti-me zangado com os agentes meus irmãos de sangue (angolano) que me extorquiram uns quantos Kz, abusando do estatuto de agentes da ordem e defensores dos cidadãos que sob a bandeira juraram proteger a soberania do território e a pátria. Mas passados alguns dias e já mais calmo penso de outra forma. Não é com eles que devo me sentir zangado mas sim com o responsável pela presença deles a patrulhar as ruas, que não lhes dá um salário digno para sobreviverem numa das cidades mais caras do mundo, e porque o exemplo vem de cima e eles são a “raia miúda” que faz o mesmo que os chefes do país.
Infelizmente quem paga a factura somos sempre nós!!!

* Acto de dar determinada quantia monetária. Hábito instituído pelos funcionários públicos e outros em Angola.

**Cerveja Nacional.

7 comentários:

Anónimo disse...

Tinhas de ser punido por lei, ou seja pagar a multa correspondente à infracção.
Não podes pesar que podes estar insento de punição.
A atitude que tiveste foi errada, e tinhas de pagar pelo teu erro, e não tinhas nada que dar "gasosas" ou "cervejas" aos policias, tinhas de admitir a culpa e ir imediatamente para a esquadra resolver o asunto.
Da próxima vez, admite que tens uma quota parte de culpa nisso, os sinais de trânsito são para sr respeitados, e se conduzes sem estar atento aos sinais tens de ser punido, é a lei...

Anónimo disse...

A construção de uma sociedade democrática, honesta e universal está nas mãos de todos os seus cidadãos. Não alimentar comportamentos e atitudes de laxismos, compadrio, fuga aos impostos, suborno e exclusão é um dever de todos porque numa situação destas existem dois lados infractores, o que suborna e o que é subornado, ainda que com atenuantes de se tratar de coacção.
A legalidade e a imparcialidade têm custas...mas para um futuro próspero para as próximas gerações têm que se correr riscos e pagar essas custas!Só assim Angola se vai encontrar no futuro dentro das sociedades mais justas e humanistas do planeta!

ANGOLA disse...

Talvez não tenhas percebido bem ou eu não tenha sido suficientemente explicito.

PONTO 1
Admiti que cometi uma infracção! MEA CULPA! Não por desconhecer o significado do sinal de trânsito mas sim porque estava num local onde a noite no lusco fusco de uma rua sem eluminação não se via.

PONTO 2
Não existe nenhuma multa de trânsito em Angola com o valor de 8.000.00Kzs.

PONTO 3
Eu apelei ao bom senso dos agentes, porque as leis não são inflexíveis e pelos motivos que já expliquei no post.

PONTO 4
Não partiu de mim nenhuma tentativa de subornar os agentes. Eu quis ir a esquadra, assumi a culpa e pagaria a multa.

Só aceitei aquele desfecho para evitar que a carta ficasse apreendida correndo o risco de se extraviar e porque tinha uma viagem no dia seguinte para uma província, por estrada, onde eu seria o condutor.

Tal como os agentes, parece que o “anónimo do comentário” também não sabe que as leis são para ser aplicadas mas atendendo aos seus infractores. ( Ser reincidente ou não)

O texto é bem ilustrativo de uma tentativa de extorsão, só não percebe quem não quer!

ANGOLA disse...

Se eu soubesse da existência do 113 e que este caso se resolveria sem "boas festas", prontamente no local tinha telefonado denunciando os agentes.
O motivo deste post não é outro senão o de alertar a quem por ventura se veja numa situação idêntica de extorsão. Para que possa ter um desfecho diferente do meu.
Nunca quis fugir as minhas responsabilidades, usei das minhas faculdades argumentativas para tentar que o agente me perdoasse e quando não mais tive argumentos quis ir para a esquadra pagar a multa competente aquela infracção. Peço ao “comentarista anónimo” que não deturpe a minha conduta.
Obrigado

Anónimo disse...

Caríssimo eu não estou a deturpar nada. Se tivesses anuído de imediato ir para a esquadra era forma de mostrares que ainda que tivesses cometido uma infracção ela resultou de uma distracção e estavas disposto a não entrar no jogo sujo destes polícias fora de lei que vêm denegrindo a instituição. Por outro lado, penso que é com este assumir e respeitar que se pode fazer frente à arbitrariedade e cumprir a lei de uma forma honesta e correcta para todos. Se a lei está mal desenvolvam-se os procedimentos para a corrigir mas se ela fora constantemente torpedeadas por esquemas alternativos como suborno, extorsão e outros ela nunca vai se alterar e a sociedade mergulha na corrupção onde de resto já está!

ANGOLA disse...

O amigo não deixa de ter razão. Na altura não tive o discernimento para poder actuar da forma que sugeriu. Estava sobre pressão de 3 agentes alcoolizados, com armas de fogo potentes e numa via sem movimento e escura, tudo o que quis foi sair daquele embaraço o mais depressa possível. Garanto ao amigo que se fosse hoje, com a informação que já tenho, iria a esquadra.
Como já disse: MEA CULPA!!!

As vezes somos encurralados entre situações que desconhecemos e acabamos por fazer, sob pressão, o errado.
Volto a dizer que o propósito deste "post" não é outro senão o de alertar os leitores para não cairem no mesmo erro que eu!

Anónimo disse...

Uma vez fiquei 6 horas à espera numa esquina de uma rua para que o chefe da esquadra viesse verificar se a minha carta era válida ou não para conduzir em Angola(carta estrangeira, perfeitamente válida para ser usada num periodo não superior a 30 dias). Teria resolvido tudo em 10 minutos se tivesse deixado a conhecida gasosa.

Seja como for, isso de ir à esquadra não faz qualquer sentido. Num país minimamente organizado, a multa seria aplicada, documentada devidamente no local, e o infractor teria a possibilidade de a) pagar a multa atempadamente no local devido, não ao policia ou b) apresentar no tribunal ou local devido a sua defesa contra a multa aplicada.

Só que em Angola estamos a anos luzes por vias das razões que todos conhecemos.